Stu Ungar faleceu há 10 anos

Lenda, génio, excêntrico, Stu Ungar será para sempre incluído no grupo dos melhores jogadores de Poker, sendo o único a ganhar o WSOP por 3 vezes. Dizem que durante a vida ganhou mais de 30 milhões de dólares do jogo, dinheiro que nunca lhe pertenceu, mas sim ao jogo que tanto amava. No passado Sábado dia 22 de Novembro, celebrou-se o 10º aniversário da morte de Stu Ungar. Recorda aqui a vida do maior gambler da História.
Lenda. Génio. Excêntrico.
Stu Hungar é considerado por muitos como o maior génio de sempre do Poker, mas a sua personalidade levou-o a ter uma vida de extremos. Vamos conhecer a história de uma das maiores lendas do Poker. Quem de perto o acompanhou, nos bons e maus momentos, facilmente recorda que Stu foi de pobre a milionário e vice-versa, pelo menos 4 vezes... Padecia de um problema. A ambição desmedida.
Como Mike Sexton (comentador do WPT) tão bem afirmou, “Stu podia ter USD$2.000.000 no bolso e não pagava a conta da luz de sua casa”. Stu Ungar nunca teve uma conta bancária, achava ridículo não poder ter acesso ao seu dinheiro a meio da noite (estávamos na altura em que não havia ATMs). Stu nem tinha identificação fiscal. Quando ganhou o WSOP de 1980 não conseguiu levantar o prémio pois pediram-lhe o cartão da Segurança Social...
Este era o génio de Stu Ungar. Vivia para o jogo e era totalmente desprendido da vida quotidiana. Convidava os amigos para jantar, ligava para o restaurante, marcava mesa, pedia comida para todos e exigia que quando lá chegassem esta já estivesse na mesa. Enquanto todos estavam a começar, Stu já tinha deixado o dinheiro em cima da mesa, com uma grande gorjeta, e já estava num taxi em direcção ao Casino onde houvesse a maior acção. “The Kid” gastava mais dinheiro em taxis do que a maioria ganhava num ano... Uma vez comprou um Mercedes e usou-o até o mesmo ficar sem óleo e o motor partir. Stu ficou furioso por não saber que o carro precisava de revisão...
O Início
Nascido no início da década de 50, em New York, era filho de Isadore “Ido” Ungar, um loan shark que geria um pequeno bar onde o jogo era propício. Afastar o filho do jogo foi algo que Ido nunca conseguiu e com a sua morte em 1968, Stu deixou os estudos e dedicou-se em full time a jogar Gin Rummy para sustentar a sua mãe e irmã. Era um notável jogador e tinha começado a ganhar torneios a partir dos 10 anos. Aos 18 já tinha uma grande reputação, mas infame graças às dívidas acumuladas nas corridas de cavalos. Stu não conseguia manter-se afastado de uma aposta... A única razão pela qual a integridade física de Stu nunca esteve em causa devia-se às suas boas ligações a outro jogador nova iorquino, Victor Romano, membro da Mafia Genovesa. Com o acumular das dívidas, Ungar parte para Las Vegas.
Las Vegas – O Mundo do Jogo
Chegado a Las Vegas, Stu conhece o amor da sua vida, Madeline, casa, tem uma filha, Stefanie, e começa a sua vida de jogador “profissional” em Gin Rummy. Este deve ter sido dos melhores momentos da vida de Ungar. Estabeleceu família e estava fazer o que mais gostava. Jogar e apostar. Mas rapidamente o sonho foi acabando...
Stu começou a ganhar a reputação de imbatível, começou a ser impedido de jogar em alguns casinos pois estes perdiam clientes quando estes sabiam que Stu estava lá a jogar. Havia investidores, com guarda costas para Ungar, a financiar os seus jogos, deixava os oponentes começar com alguma vantagem e até deixava alguns jogadores fazerem batota. Ganhava sempre... Rapidamente a acção de Gin Rummy acabou. E teve um fim no dia em que derrotou Harry "Yonkie" Stein. O melhor jogador de Gin Rummy da actualidade, segundo a reputação em Las Vegas. A derrota foi de tal forma humilhante que Stein abandonou o jogo para sempre. Nesse dia, o Gin Rummy acabou para Ungar. Já não havia mais para subir.
Stu não podia parar. Perdia todos os seus rendimentos em corridas de cavalos e Blackjack. Stu também foi proibido de jogar e multado pela Comissão de Jogo de Las Vegas por contar cartas num jogo de Blackjack. Ele chegava a conseguir contar 6 baralhos de cartas num jogo de Blackjack. Stu era dotado de um elevado quociente de inteligência e uma memória fotográfica exemplar.
Nunca recusava um desafio e uma aposta. Por exemplo, sem nunca ter pegado num taco de golf na vida, aceitou jogar a USD$500 o buraco com Jack ‘Treetop’ Strauss. Num único dia perdeu USD$78.000.
Stu precisava de mais um desafio e um jogo que preenchesse a sua sede e ambição de grandeza. Se Stu estava num jogo para ganhar USD$5.000 e alguém dissesse que algures na cidade havia um jogo para USD$10.000, levantava-se logo e chamava um táxi para ir jogar esse jogo.
Estavam reunidas as condições. Stu “The Kid” Ungar iniciou-se no Mundo do Poker.
O Mundo do Poker de Las Vegas
Ungar tinha uma capacidade de compreensão e aprendizagem muito acima da média. Se alguém lhe explicasse um novo jogo, em um único dia ele seria melhor que qualquer pessoa que tivesse praticado a vida toda.
A melhor maneira de ganhar reputação e estar onde havia mais acção, era participar no World Series of Poker (WSOP). Assim, em 1980 ganha o torneio pela primeira vez derrotando no Heads Up o lendário Doyle Brunson. Tornou-se no mais jovem jogador a ganhar o torneio sendo só ultrapassado por Phil Helmuth, que venceu em 1989 com 24 anos.
Aqui começou a subida de Stu Ungar, a lenda do Poker.
Neste momento começa a participar em torneios de elevados buy ins, começa a participar em mesas de ring e atravessa outro bom período da sua vida. Sem nunca deixar as corridas de cavalos e o Blackjack, Stu facilmente arruinava a sua estabilidade financeira. Quando tinha dinheiro pagava tudo a toda a gente, se sabia que algum amigo estava numa bad streak pagava-lhe as rendas de casa, pagava jantares e dava grandes gorjetas. Para ele, o dinheiro não tinha valor. Valor tinha o jogo, o risco e a vontade de demonstrar que era melhor que todos. Não tinha feitio para ser um hustler e tirar mais dinheiro de um oponente. Deixava-o humilhado e na penúria na primeira oportunidade que tivesse. Se estava numa ring, a jogar a USD$100/200 e abrisse uma mesa de 200/400, Stu seria o primeiro a sentar-se na mesa. Nenhum jogo era demasiado grande. Nessa altura desenvolve o vício pelas drogas, com especial ênfase na cocaína, droga reconhecida pela sua capacidade de aumentar os níveis de stamina e potenciar a concentração. A droga ideal para Stu. Podia jogar no seu melhor durante mais horas... Mas como qualquer droga, o vício apoderou-se do seu ritmo de vida e às dívidas de jogo, rapidamente acumulou dívidas a vários traficantes. Nada que assusta-se Stu.
Em 1981 volta a inscrever-se no WSOP e volta a ganhar. Em duas participações, duas vitórias. Stu torna-se cada vez mais reputado e mais rico.
Mas para Stu, era o pior que podia acontecer. Não havia mais alto para subir...
O Início da Queda
A partir desse momento, a vida de Stu Ungar torna-se num pequeno inferno. Sem jogos grandes para vencer, proibido de jogar Blackjack, o Gin Rummy estava morto, Stu começa a jogar Poker aos mais altos níveis para financiar o seu vício. As dívidas a amigos, loan sharks, bookies e traficantes aumentavam cada vez mais e apenas algumas pessoas seguiam do seu lado a dar todo o apoio possível. Entre eles Mike Sexton, Todd Brunson e Bob Stupak. Durante esse tempo participava em quase todos os grandes torneios, incluindo o agora extinto Amarillo Slim’s Super Bowl of Poker, ganhando em 1983, 1988 e 1989. Em 1986 divorcia-se de Madeline e afunda-se mais um pouco na sua vida. Nos 10 anos que se seguiram a vida de Stu limitou-se a sobreviver, enriquecer, esbanjar, sobreviver, etc... Daí a frase de Mike Sexton supra citada.
No WSOP de 1990, ao terceiro dia Stu sofreu uma overdose. Mas era de tal forma chip leader que acabou por ficar em 9º e receber USD$25.050.
Vivendo à grande nos momentos altos e pedindo aos amigos nos momentos menos bons, Stu raramente saldava as suas dívidas. Se tinha dinheiro era para dar e jogar. Nunca para pagar o que devia...
Até 1997 a vida de Stu foi um autêntico sobe e desce. Até que aí acontece o impensável.
WSOP 1997
Em 1997, Ungar pede USD$10.000 para a inscrição no WSOP a Billy Baxter, jogador profissional e dos poucos amigos que ainda tinha. Stu aparece no evento com um aspecto magro, pálido, fraco, com uns óculos redondos azuis tipo John Lennon, com o seu nariz completamente destruído pelo consumo de cocaína e passa os primeiros 2 dias com alguma dificuldade. Para Stu jogar com blinds a 25/50 ou 50/100 era um martírio. Apenas quando se chegava aos níveis com “antes” é que Stu se revelava. Segundo Mike Sexton, os jogadores pagavam as antes com umas fichas verdes. Ao fim de algumas horas, Stu estava carregado das tais fichas verdes. Contra todas as expectativas, vence John Strzemp no Heads Up e ganha USD$1.000.000.
Nesta altura julgavam que Ungar estava de volta e voltou a ser baptizado. Desta vez como “The Comeback Kid”, o regresso das cinzas para o Kid...
The End Of The Line
Depois da vitória no WSOP volta à vida que tanto estava habituado, de jogo, drogas e a desconexão total da vida comum e volta à pobreza e dívidas acumuladas em toda a cidade. Stu dividiu com Baxter o prémio e nesses 7 meses gastou os USD$500.000. Numa situação de aperto volta a pedir dinheiro a Baxter, desta vez, a última, USD$25.000. Baxter ajuda o seu amigo, pois como sempre, confiava que ele daria a volta por cima.
Numa semana perdeu cerca de USD$10.000 no Bellagio Casino e foi encontrado morto num Motel a norte de Las Vegas com apenas USD$800 no bolso...
Não foi uma overdose que o matou mas sim um ataque cardíaco. O coração que vivia para o jogo, deixou de aguentar tais subidas e descidas.
Lenda, génio, excêntrico, Stu Ungar será para sempre incluído no grupo dos melhores jogadores de Poker de sempre e sendo o único a ganhar o WSOP por 3 vezes. Dizem que durante a vida ganhou mais de 30 milhões de dólares do jogo, dinheiro que nunca lhe pertenceu, mas sim ao jogo que tanto amava.
Stu morreu sem um único bem em sua posse, tendo alguns amigos feito uma colecta para pagar o funeral.
Para muitos uma lenda, para outros um louco... quer se goste ou não, Stu Ungar está para o Poker, como Mozart está para a música.
Genialidade no estado puro...
Apesar da postura de Stu Ungar, nas mesas de Poker, ser algo que ainda hoje é recordado e copiado, ele foi um caso errático na história do Poker. A sua história serviu de lição a muitos jogadores. Muitos deles que seguiram e acompanharam a vida de Stu, hoje são grandes profissionais e modelos a seguir, dentro e fora das mesas de Poker. De certa forma, o percurso de Stu Ungar veio demonstrar ao Mundo do Poker em que vivemos, que controlo, disciplina e responsabilidade são factores primordiais num jogador profissional de Poker.
Podem recordar alguns desses momentos, neste vídeo: